Os Judeus sob Domínio Estrangeiro
Este é o 3º artigo desta série. Os dois primeiros são:
01 - Paulo, uma Introdução
02 - O Crescimento de Roma
De Ciro até Vespasiano
Ciro, o fundador do Império Persa (559-529 a.C.), e seus sucessores foram os imperialistas mais iluminados que o mundo antigo tinha visto atém aquela época. Eles entenderam a sabedoria de manter as nações súditas contentes. Em vez de deportá-las à força para regiões distantes, a fim de quebrar sua vontade ou sua capacidade para rebelar-se, como tinham feito os assírios e os babilônios, eles os deixaram viver em sua pátria (a não ser que preferissem morar em outro lugar). Em vez de obrigá-los a adorar os deuses da etnia dominadora, incentivavam-nos a praticar sua religião ancestral e até, às vezes, davam ajuda financeira para isto. Há evidências desta política no Egito (que eles conquistaram em 525 a.C.), e entre as colônias gregas no oeste da Ásia Menor, assim como no trato deles com os exilados na Judéia que eles autorizaram a retornar ao seu território nativo, de onde tinham sido arrancados pelos babilônios. Havia dois níveis de administração da província da Judéia sob os persas. O rei persa era representado por um governador, que podia ser judeu (como Neemias) ou não. O governador era responsável para salvaguardar os interesses imperiais, como a manutenção da segurança e a arrecadação dos tributos. A administração interna da Judéia, porém, estava nas mãos do sumo sacerdote – sempre um membro da família de Zadoque. A Judéia sob os persas cobria uma área restrita em torno de Jerusalém; estava organizada como um estado-templo, sendo que à cidade de Jerusalém foi conferida a condição de cidade santa. Havia outros estados-templo organizados dentro do Império Persa, que mantiveram esta condição, quando o domínio persa foi substituído pelo dos gregos e macedônios, depois da conquista de Alexandre, o Grande (336-323 a.C.). Quando o império de Alexandre foi dividido após a sua morte, a Judéia se viu submetida primeiro à dinastia dos ptolomeus, que governavam a partir de Alexandria, e mais tarde (após 198 a.C.) à dos selêucidas, que governavam a partir de Antioquia na Síria. Jerusalém e Judéia, porém, mantiveram sua constituição sacra, exceto em algumas tentativas de abolir ou modificá-la, até a irrupção da revolta judaica contra Roma em 66 d.C.
A tentativa mais digna de nota de abolir a constituição sacra de Jerusalém e Judéia foi feita pelo rei selêucida Antíoco IV (175-164 a.C.) que, em boa parte por razões de segurança externa, tentou assimilar os súditos judeus à cultura e religião do estilo de vida helenista que era seguido nos seus demais domínios. A Judéia ficava na fronteira entre o reino dele e o Egito, e esta fronteira passou a ser um ponto sensível depois que os romanos assumiram o papel de protetores do Egito contra as ambições selêucidas em 168 a.C. A política de Antíoco estava mal orientada e acabou em fracasso. Os judeus, sob Judas Macabeu e seus irmãos, levantaram uma resistência que fez com que eles recuperassem sua liberdade religiosa em 164 a.C. e, vinte e dois anos mais tarde (em boa parte graças à guerra civil do reino selêucida), a liberdade política. Por quase oitenta anos a Judéia foi governada pela dinastia nativa dos sacerdotes-reis hasmoneus.
Quando a Judéia caiu sob controle romano em 63 a.C., a monarquia hasmonéia foi abolida, mas a santidade de Jerusalém, mantida. Por algum tempo os romanos preferiram controlar a Judéia de modo indireto, por meio de governantes judeus – em especial por meio de Herodes, o Grande (37-34 a.C.), que violou sua constituição sacra com mais desrespeito do que qualquer soberano gentio, com exceção de Antíoco IV. Quando, porém, no ano 6 d.C., a Judéia foi transformada em província romana, ela recebeu o mesmo tipo de administração em dois níveis que tinha sob domínio persa e greco-macedônio. O imperador romano indicava um governador provincial, chamado de prefeito ou procurador, que era responsável por manter a paz e a ordem e por garantir a arrecadação suficiente do “tributo a César”. Os assuntos internos dos judeus na Judéia, no entanto, eram administrados pelo sumo sacerdote, junto com um conselho de setenta anciãos (o Sinédrio), o qual ele presidia ex officio. O sumo sacerdote e seus companheiros naturalmente reconheciam o poder supremo de Roma, e se esforçavam para manter relações razoavelmente boas com o governador. Isto, às vezes, não era tarefa fácil, por causa da inexperiência ou insensibilidade de alguns governadores. Entretanto, como último recurso, o sumo sacerdote e seus amigos tinham canais de comunicação com Roma, de modo a passar por cima da cabeça do governador e registrar uma queixa que podia levá-lo a ser severamente reprimido ou até a ser demitido do cargo. Um dos melhores exemplos deste jogo de poder ente os dois postos de autoridade na província é a ação e reação entre os principais sacerdotes e Pôncio Pilatos nos relatos do julgamento de Jesus nos evangelhos.
Apesar de seus interesses internos estarem nas mãos da sua própria organização religiosa, muitos judeus da Judéia sentiam coceira com o governo romano. É verdade que eles tinham de pagar impostos dobrados: o tributo a César tinha de ser pago além e acima das suas obrigações com o templo (que excedia em muito o dízimo, o imposto de dez por cento sobre a renda). Os principais sacerdotes e líderes do Sinédrio eram ricos, a ponto de não terem suficiente percepção da pressão econômica em que viviam seus conterrâneos mais pobres; além disso, eles sabiam que a manutenção do seu estilo de vida dependia da estabilidade da ordem existente. Seu modus vivendi com as forças de ocupação, portanto, não ajudava em nada a torná-los mais queridos ao povo comum.
Algumas províncias do império assimilaram a civilização romana de maneira tão completa que seus habitantes passaram a considerar-se romanos, e seus descendentes até hoje falam línguas que se desenvolveram do “latim vulgar”. Os judeus da Judéia talvez fossem os menos assimilados de todos os súditos de Roma. Isso se devia a sua religião única e exclusiva, cuja prática lhes estava garantida por decretos imperiais, como lhes fora prometido por soberanos anteriores. Sob estes governantes gentios anteriores, nunca fora imposto aos judeus que pagassem um tributo que, de alguma forma, lhes fosse ofensivo ao Deus que adoravam. No momento em que este pagamento de tributo a estrangeiros recebia um significado religioso, tendia a ser interpretado como um sinal de desprazer de Iahveh com seu povo: se ele permitia que estrangeiros governassem sobre eles, o pagamento de tributo a eles era um ato de submissão ao julgamento divino. Quando, porém, a Judéia se tornou uma província romana em 6 d.C., e sua população foi obrigada a pagar tributo diretamente ao imperador, uma nova doutrina começou a ser difundida: que Israel , como povo de Deus, vivendo na terra santa, ao reconhecer um governante pagão pagando-lhe tributo, tornava-se culpado de alta traição contra o Deus dos seus antepassados, o verdadeiro rei de Israel. O principal ensinador desta nova doutrina era Judas, o Galileu, que na época liderou uma revolta contra o governo romano da nova província. A revolta foi sufocada, mas o ensino sobreviveu e tornou-se um traço dominante da política dos zelotes. O partido dos zelotes, que não faziam distinção entre o que chamaríamos de política e religião, passou a ser ativo de 44 d.C. em diante, apesar de não ter iniciado a revolta contra Roma em 66 d.C., logo assumiu a liderança da guerra que estourou.
Os revoltados continuaram a guerra com esperança contra todas as evidências. Eles tinham encarado a luta para restaurar os direitos do Deus de Israel à coroa; ele não podia entregá-los à própria sorte. Confiaram em um oráculo antigo – talvez uma combinação de oráculos – que entendiam estarem na hora de se cumprir, segundo os quais do domínio do mundo devia passar das mais dos gentios para as dos judeus. Uma vitória inicial sobre forças romanas muito superiores encheu-os da confiança de que os sucessos de Judas Macabeu (que, como seus companheiros, fora impelido por um zelo por Deus semelhante) se repetiriam na experiência deles. As guerras intestinas em todo o império e na própria Roma, que marcaram o “ano dos quatro imperadores” (69 d.C.), os fizeram pensar que o imperialismo gentio, representado pelo estado romano, estava em seus estertores de morte. No fim, porém, foi a comunidade judaica, na forma que assumira desde o exílio babilônico seis séculos antes, que desabou. O templo em Jerusalém foi queimado, a cidade saqueada e deixada em ruínas, sua condição sacra abolida, o sistema de sumos sacerdotes extinto, a ordem de sacrifícios encerrada. O meio siclo anual que os judeus adultos em todo o mundo tinham até então pago para a manutenção do templo, sob a proteção das autoridades romanas, dali em diante tinham de ser pago a um fundo especial – o fiscus indiacus – para o sustento do templo de Júpiter no monte Capitolino em Roma.
Mesmo na Judéia, no entanto, a situação dos judeus poderia ter sido pior. Eles obtiveram permissão para instituir um novo Sinédrio de estudiosos para codificar sua lei religiosa, e, na verdade, a vida religiosa judaica floresceu ainda melhor depois que o templo e seu ritual desapareceram.
Os Judeus da Dispersão
Naquela época, como hoje, havia muito mais judeus vivendo fora da Judéia do que dentro das suas fronteiras, e (exceto na cobrança do fiscus indaicus depois de 70 d.C.) os judeus da dispersão não perderam os privilégios que tinham em relação à lei romana, em resultado da guerra. Houve agitações antijudaicas e perseguições em diversas cidades da Síria e do Egito, mas isso era outra questão. Na verdade, uma sucessão de editos promulgados pelas mais altas autoridades tinha garantido aos judeus, em todo o Império Romano, privilégios bem excepcionais, e estes não foram revogados.
A história da dispersão judaica pode ser traçada desde o começo do sexto século a.C. desta época. Temos amplas evidências de que judeus tinham se fixado no Egito, e indícios em lugares na Ásia Menor, tão distantes como Sardes, capital do reino da Lídia (a Sefarade de Ob 20). Um grande número de exilados na Babilônia se fixara em seu novo lar e não fizeram uso da permissão de retornar à Judéia. Sob governo persa, eles podiam ser encontrados em todos os territórios do império, até nas margens do mar Cáspio; e as conquistas de Alexandre lhes possibilitaram espalhar-se para ainda mais longe. Houve judeus morando em Alexandria, desde a sua fundação em 331 a.C., o primeiro século d.C. os judeus eram maioria em dois dos cinco bairros da cidade. Por volta de 300 a.C., o primeiro Ptolomeu colocou um grupo de judeus na Cirenaica, para ajudar a garantir a lealdade desta província. Um século mais tarde, o rei selêucida Antíoco III, com propósito similar, mudou muitos judeus para a Frigia e a Lídia, e depois que arrebatou a Judéia e a Celessíria dos ptolomeus, encorajou povoamentos judaicos em Antioquia, sua capital, e em outras cidades do seu reino. Na própria Roma, havia uma colônia judaica, mesmo antes da incorporação da Judéia no império em 63 a.C., e ela aumentou em muito nos anos seguintes. Estima-se que no princípio do primeiro século d.C., havia entre 40.000 e 60.000 judeus em Roma – provavelmente tantos quantos na própria Jerusalém. A descoberta e estudo de seis catacumbas judaicas em Roma aumentaram muito nosso conhecimento da vida judaica na cidade. Os judeus de Roma parecem ter se concentrado na margem direita do Tibre (Tastevere), onde a maioria das onze sinagogas atestadas por inscrições provavelmente estava localizada.
A extensão da dispersão judaica, na época dos apóstolos, é evidente na lista de Lucas de “judeus, homens piedosos” que estavam presentes em Jerusalém, para a festa de Pentecostes em 30 d.C., desde “partos, medos, elamitas e os naturais da Mesopotâmia” até visitantes de Roma, no oeste, “tanto judeus como prosélitos” (At. 2.5-11).
Não deixe de ler o próximo artigo: CIDADE NÃO INSIGNIFICANTE
Ciro, o fundador do Império Persa (559-529 a.C.), e seus sucessores foram os imperialistas mais iluminados que o mundo antigo tinha visto atém aquela época. Eles entenderam a sabedoria de manter as nações súditas contentes. Em vez de deportá-las à força para regiões distantes, a fim de quebrar sua vontade ou sua capacidade para rebelar-se, como tinham feito os assírios e os babilônios, eles os deixaram viver em sua pátria (a não ser que preferissem morar em outro lugar). Em vez de obrigá-los a adorar os deuses da etnia dominadora, incentivavam-nos a praticar sua religião ancestral e até, às vezes, davam ajuda financeira para isto. Há evidências desta política no Egito (que eles conquistaram em 525 a.C.), e entre as colônias gregas no oeste da Ásia Menor, assim como no trato deles com os exilados na Judéia que eles autorizaram a retornar ao seu território nativo, de onde tinham sido arrancados pelos babilônios. Havia dois níveis de administração da província da Judéia sob os persas. O rei persa era representado por um governador, que podia ser judeu (como Neemias) ou não. O governador era responsável para salvaguardar os interesses imperiais, como a manutenção da segurança e a arrecadação dos tributos. A administração interna da Judéia, porém, estava nas mãos do sumo sacerdote – sempre um membro da família de Zadoque. A Judéia sob os persas cobria uma área restrita em torno de Jerusalém; estava organizada como um estado-templo, sendo que à cidade de Jerusalém foi conferida a condição de cidade santa. Havia outros estados-templo organizados dentro do Império Persa, que mantiveram esta condição, quando o domínio persa foi substituído pelo dos gregos e macedônios, depois da conquista de Alexandre, o Grande (336-323 a.C.). Quando o império de Alexandre foi dividido após a sua morte, a Judéia se viu submetida primeiro à dinastia dos ptolomeus, que governavam a partir de Alexandria, e mais tarde (após 198 a.C.) à dos selêucidas, que governavam a partir de Antioquia na Síria. Jerusalém e Judéia, porém, mantiveram sua constituição sacra, exceto em algumas tentativas de abolir ou modificá-la, até a irrupção da revolta judaica contra Roma em 66 d.C.
A tentativa mais digna de nota de abolir a constituição sacra de Jerusalém e Judéia foi feita pelo rei selêucida Antíoco IV (175-164 a.C.) que, em boa parte por razões de segurança externa, tentou assimilar os súditos judeus à cultura e religião do estilo de vida helenista que era seguido nos seus demais domínios. A Judéia ficava na fronteira entre o reino dele e o Egito, e esta fronteira passou a ser um ponto sensível depois que os romanos assumiram o papel de protetores do Egito contra as ambições selêucidas em 168 a.C. A política de Antíoco estava mal orientada e acabou em fracasso. Os judeus, sob Judas Macabeu e seus irmãos, levantaram uma resistência que fez com que eles recuperassem sua liberdade religiosa em 164 a.C. e, vinte e dois anos mais tarde (em boa parte graças à guerra civil do reino selêucida), a liberdade política. Por quase oitenta anos a Judéia foi governada pela dinastia nativa dos sacerdotes-reis hasmoneus.
Quando a Judéia caiu sob controle romano em 63 a.C., a monarquia hasmonéia foi abolida, mas a santidade de Jerusalém, mantida. Por algum tempo os romanos preferiram controlar a Judéia de modo indireto, por meio de governantes judeus – em especial por meio de Herodes, o Grande (37-34 a.C.), que violou sua constituição sacra com mais desrespeito do que qualquer soberano gentio, com exceção de Antíoco IV. Quando, porém, no ano 6 d.C., a Judéia foi transformada em província romana, ela recebeu o mesmo tipo de administração em dois níveis que tinha sob domínio persa e greco-macedônio. O imperador romano indicava um governador provincial, chamado de prefeito ou procurador, que era responsável por manter a paz e a ordem e por garantir a arrecadação suficiente do “tributo a César”. Os assuntos internos dos judeus na Judéia, no entanto, eram administrados pelo sumo sacerdote, junto com um conselho de setenta anciãos (o Sinédrio), o qual ele presidia ex officio. O sumo sacerdote e seus companheiros naturalmente reconheciam o poder supremo de Roma, e se esforçavam para manter relações razoavelmente boas com o governador. Isto, às vezes, não era tarefa fácil, por causa da inexperiência ou insensibilidade de alguns governadores. Entretanto, como último recurso, o sumo sacerdote e seus amigos tinham canais de comunicação com Roma, de modo a passar por cima da cabeça do governador e registrar uma queixa que podia levá-lo a ser severamente reprimido ou até a ser demitido do cargo. Um dos melhores exemplos deste jogo de poder ente os dois postos de autoridade na província é a ação e reação entre os principais sacerdotes e Pôncio Pilatos nos relatos do julgamento de Jesus nos evangelhos.
Apesar de seus interesses internos estarem nas mãos da sua própria organização religiosa, muitos judeus da Judéia sentiam coceira com o governo romano. É verdade que eles tinham de pagar impostos dobrados: o tributo a César tinha de ser pago além e acima das suas obrigações com o templo (que excedia em muito o dízimo, o imposto de dez por cento sobre a renda). Os principais sacerdotes e líderes do Sinédrio eram ricos, a ponto de não terem suficiente percepção da pressão econômica em que viviam seus conterrâneos mais pobres; além disso, eles sabiam que a manutenção do seu estilo de vida dependia da estabilidade da ordem existente. Seu modus vivendi com as forças de ocupação, portanto, não ajudava em nada a torná-los mais queridos ao povo comum.
Algumas províncias do império assimilaram a civilização romana de maneira tão completa que seus habitantes passaram a considerar-se romanos, e seus descendentes até hoje falam línguas que se desenvolveram do “latim vulgar”. Os judeus da Judéia talvez fossem os menos assimilados de todos os súditos de Roma. Isso se devia a sua religião única e exclusiva, cuja prática lhes estava garantida por decretos imperiais, como lhes fora prometido por soberanos anteriores. Sob estes governantes gentios anteriores, nunca fora imposto aos judeus que pagassem um tributo que, de alguma forma, lhes fosse ofensivo ao Deus que adoravam. No momento em que este pagamento de tributo a estrangeiros recebia um significado religioso, tendia a ser interpretado como um sinal de desprazer de Iahveh com seu povo: se ele permitia que estrangeiros governassem sobre eles, o pagamento de tributo a eles era um ato de submissão ao julgamento divino. Quando, porém, a Judéia se tornou uma província romana em 6 d.C., e sua população foi obrigada a pagar tributo diretamente ao imperador, uma nova doutrina começou a ser difundida: que Israel , como povo de Deus, vivendo na terra santa, ao reconhecer um governante pagão pagando-lhe tributo, tornava-se culpado de alta traição contra o Deus dos seus antepassados, o verdadeiro rei de Israel. O principal ensinador desta nova doutrina era Judas, o Galileu, que na época liderou uma revolta contra o governo romano da nova província. A revolta foi sufocada, mas o ensino sobreviveu e tornou-se um traço dominante da política dos zelotes. O partido dos zelotes, que não faziam distinção entre o que chamaríamos de política e religião, passou a ser ativo de 44 d.C. em diante, apesar de não ter iniciado a revolta contra Roma em 66 d.C., logo assumiu a liderança da guerra que estourou.
Os revoltados continuaram a guerra com esperança contra todas as evidências. Eles tinham encarado a luta para restaurar os direitos do Deus de Israel à coroa; ele não podia entregá-los à própria sorte. Confiaram em um oráculo antigo – talvez uma combinação de oráculos – que entendiam estarem na hora de se cumprir, segundo os quais do domínio do mundo devia passar das mais dos gentios para as dos judeus. Uma vitória inicial sobre forças romanas muito superiores encheu-os da confiança de que os sucessos de Judas Macabeu (que, como seus companheiros, fora impelido por um zelo por Deus semelhante) se repetiriam na experiência deles. As guerras intestinas em todo o império e na própria Roma, que marcaram o “ano dos quatro imperadores” (69 d.C.), os fizeram pensar que o imperialismo gentio, representado pelo estado romano, estava em seus estertores de morte. No fim, porém, foi a comunidade judaica, na forma que assumira desde o exílio babilônico seis séculos antes, que desabou. O templo em Jerusalém foi queimado, a cidade saqueada e deixada em ruínas, sua condição sacra abolida, o sistema de sumos sacerdotes extinto, a ordem de sacrifícios encerrada. O meio siclo anual que os judeus adultos em todo o mundo tinham até então pago para a manutenção do templo, sob a proteção das autoridades romanas, dali em diante tinham de ser pago a um fundo especial – o fiscus indiacus – para o sustento do templo de Júpiter no monte Capitolino em Roma.
Mesmo na Judéia, no entanto, a situação dos judeus poderia ter sido pior. Eles obtiveram permissão para instituir um novo Sinédrio de estudiosos para codificar sua lei religiosa, e, na verdade, a vida religiosa judaica floresceu ainda melhor depois que o templo e seu ritual desapareceram.
Os Judeus da Dispersão
Naquela época, como hoje, havia muito mais judeus vivendo fora da Judéia do que dentro das suas fronteiras, e (exceto na cobrança do fiscus indaicus depois de 70 d.C.) os judeus da dispersão não perderam os privilégios que tinham em relação à lei romana, em resultado da guerra. Houve agitações antijudaicas e perseguições em diversas cidades da Síria e do Egito, mas isso era outra questão. Na verdade, uma sucessão de editos promulgados pelas mais altas autoridades tinha garantido aos judeus, em todo o Império Romano, privilégios bem excepcionais, e estes não foram revogados.
A história da dispersão judaica pode ser traçada desde o começo do sexto século a.C. desta época. Temos amplas evidências de que judeus tinham se fixado no Egito, e indícios em lugares na Ásia Menor, tão distantes como Sardes, capital do reino da Lídia (a Sefarade de Ob 20). Um grande número de exilados na Babilônia se fixara em seu novo lar e não fizeram uso da permissão de retornar à Judéia. Sob governo persa, eles podiam ser encontrados em todos os territórios do império, até nas margens do mar Cáspio; e as conquistas de Alexandre lhes possibilitaram espalhar-se para ainda mais longe. Houve judeus morando em Alexandria, desde a sua fundação em 331 a.C., o primeiro século d.C. os judeus eram maioria em dois dos cinco bairros da cidade. Por volta de 300 a.C., o primeiro Ptolomeu colocou um grupo de judeus na Cirenaica, para ajudar a garantir a lealdade desta província. Um século mais tarde, o rei selêucida Antíoco III, com propósito similar, mudou muitos judeus para a Frigia e a Lídia, e depois que arrebatou a Judéia e a Celessíria dos ptolomeus, encorajou povoamentos judaicos em Antioquia, sua capital, e em outras cidades do seu reino. Na própria Roma, havia uma colônia judaica, mesmo antes da incorporação da Judéia no império em 63 a.C., e ela aumentou em muito nos anos seguintes. Estima-se que no princípio do primeiro século d.C., havia entre 40.000 e 60.000 judeus em Roma – provavelmente tantos quantos na própria Jerusalém. A descoberta e estudo de seis catacumbas judaicas em Roma aumentaram muito nosso conhecimento da vida judaica na cidade. Os judeus de Roma parecem ter se concentrado na margem direita do Tibre (Tastevere), onde a maioria das onze sinagogas atestadas por inscrições provavelmente estava localizada.
A extensão da dispersão judaica, na época dos apóstolos, é evidente na lista de Lucas de “judeus, homens piedosos” que estavam presentes em Jerusalém, para a festa de Pentecostes em 30 d.C., desde “partos, medos, elamitas e os naturais da Mesopotâmia” até visitantes de Roma, no oeste, “tanto judeus como prosélitos” (At. 2.5-11).
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1 Comments:
Confesso que meu primeiro contato com seu blog foi numa pesquisa enquento eu , como leigo , estudava o "livro das crônicas" ao examinar, não pude sair sem deixar aqui o meu agradecimento por tão ricas e claras informações!!quero em cristo agradecer-te meu caro pois fui muito ajudado por tal!!
Muito grato sou-lhe!
Thiago H. Souza
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